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Opiniões 2002 .... 17 |
Aldemir mi viejo![]() Retrato de Pedro, bico-de-pena, 22 x 32 cm, São Paulo, 1950 |
Pedro e Mariana Martins são filhos de Aldemir Martins. Ser filho de artista não é fácil. Ambos, nos textos anexos, falam do Aldemir, do pai. Cada um a seu modo revela o que é ser filho de artista. CvS O talento fez do Aldemir o que ele é para a arte contemporânea brasileira, desenhista dos melhores e pintor por profissão. A primeira lembrança que eu tenho de pai foi no encontro na casa de Dona Eudocia, onde vi a capa da revista do “rádio”. Aldemir um vencedor premiado. Foi um misto de orgulho e curiosidade. Almoçamos no Filet do Morais, ganhei um relógio Mido, e um banho de loja onde ele se mostrou um verdadeiro sedutor. Aldemir dividiu comigo a dedicação de Cora, sua casa de bem estar, com gatos felizes e minha irmã Mariana, uma boneca índia. Nessas lembranças posso até pensar em um bolero: “... Viejo mi querido viejo ahora ja caminas lento... jo soy tu sangre mi viejo...” Pedro Martins, 1961 |
![]() Retrato de Cora, nanquim sobre papel japonês, 52 x 37 cm, São Paulo, 1955 |
![]() Cora e Mariana, bico-de-pena, 57 x 45 cm, 1959 |
Uma pergunta que inúmeras vezes me
fizeram ao longo da vida foi: “Como
é ser filha do Aldemir Martins?” e isso
sempre me deixou pensativa, sem saber
como responder, já que eu nunca
soube o que é ser filha de outro homem.
A vida de classe média das minhas amigas, com orçamento certo mensal, bife, batatas fritas, arroz e feijão todos os dias, sonho da casa própria e de uma aposentadoria bem remunerada me causavam uma certa melancolia, uma certa nostalgia do lugar-comum, de uma vida sem sobressaltos, onde meu pai não fosse absoluta e histericamente famoso para alguns poucos e um total desconhecido anônimo para a grande maioria. Durante toda a minha infância e juventude a cultura brasileira esteve fora das salas de aula, portanto, para a minha turma de escola, não existiam artistas nacionais, não se falava em Tarsila ou Portinari, aliás, só se falava em física, química e biologia, dando a entender que literatura e desenho eram coisa de vagabundos que não queriam estudar para passar no vestibular… Gostaria muito que os artistas nacionais fossem amplamente conhecidos por todas as camadas da população, que a produção cultural brasileira fosse mais divulgada e incentivada, para que meu pai fosse reconhecido por todos, não mais por uns do que por outros e não como “o maior”, “o único”, “o melhor”, mas como mais um dentre os muitos que tentam melhorar a arte nacional e, certamente, um dos mais profundamente brasileiros. Talvez nesse dia eu saiba responder o que é ser filha de um grande artista e não me sinta mais tão esquizofrênica. Mariana Martins |