"Durante muito tempo Caciporé Torres trabalhou com materiais duros e pesados, como o ferro. Sua obra também era
feita de durezas e rigores. Uma superficie escolhida e planificada, estendida, em desenvolvimento, e como se fossem
erupções, cones e formas que surgiam e se destacavam. Placas e saliências, costuras no metal, qualquer coisa de aparência
muito industrial, muito íntegra, de personalidade marcada, áspera e definitiva. Um artista desta epoca, um artista de
centro industrializado. Um homem que assistiu e se formou num século que viu duas guerras mundiais, a reformulação
política de continentes inteiros, guerras de extermínio, guerras localizadas, povos sem terra, multidôes de exilados,
natureza destruída, rios mortos, regiôes contaminadas e radioativas. E viu, igualmente, o homem na lua, o desenvolvimento
da psicologia, a revalorização da emoção, a retomada do humanismo, as lutas solidárias pelos homens perseguidos, o
ressurgimento do sagrado.
Caciporé Torres é o sensível homem e artista deste período. 0 que se expressa nas formas torturadas de sua escultura
e, igualmente, no respeito ao fazer e ao rigor formal da arte. A identificação da tortura e a fé no trabalho do homem.
Por aproximação espiritual, ele estaria ligado a artistas como Giacometti, Bacon, Chadwick. No Brasil, há longos anos
Caciporé representa uma presença marcante, signo e símbolos de um caminho para o qual o pais caminha, consciência altiva
da necessidade do urbano e figura significativa da atividade cultural.
Depois de muitos anos o artista volta a fazer uma exposição individual. Nesta sua ausência, Caciporé tornava-se
presente através de obras de grande porte destinadas a espços públicos. A sua volta nos traz um material mais suave e
dócil, o bronze. As formas se encaminham para uma preocupação estética mais elaborada e o artista joga com planos,
oposições e rítmos, diálogo entre a superfície plana e o volume e, principalmente, se estabelece no seu trabalho uma
extraordinária discussão das questões escultórias. Desta maneira, Caciporé Torres preocupa-se e nos expôe a questâo
monumentalidade e, mais uma vez, fica demonstrado que monumentalidade tem a ver unicamente com a proporção entre as
diversas partes, e não com o tamanho. A outra discussão que o seu trabalho coloca e o resultado que se obtém com a
oposição de ritmos e planos. Nestes trabalhos, Caciporé homenageia obras e escultores, retomando temas e recolocando-os
em pauta. É necessário notar, ainda, que o escultor permanece fiel e coerente com as suas principais preocupações, os
volumes, as materias laceradas, as interrupções de ritmos. Trata-se de realizar o projeto de um símbolo, a construção
de um monumento ao século vinte."
por Jacob Klintovitz