"CONEXÃO COM A ALMA"

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A cada novo dia em que desperto, pela manhã, Cláudia Simões me propicia uma alegria e me leva a viajar a um universo de fantasia. A maravilha, aliás, também ocorre em outras circunstâncias em que eu acorde, talvez com sede, com fome, ou de um pesadelo eventual. Não, não, que ninguém confunda o nosso relacionamento. Eu mal vejo, pessoalmente, Cláudia Simões, grande amiga de Vivian Cury, minha mulher, a sua fotógrafa predileta. Mal vejo, e sequer tive o privilégio de conhecer os seus dois paraísos de praia e de campo, no alto do Bonete, Ubatuba, e em Visconde de Mauá.

De todo modo, provém da sua sensibilidade extraordinária e do seu talento raro a primeira imagem que os meus olhos absorvem ao se abrirem – uma aquarela majestosa, paisagem de Veneza, pregada a uma parede do meu quarto de dormir. Cláudia, de fato, se tornou uma especialista admirável nessa arte complexíssima de registrar, com as suas transparências incríveis, invariavelmente fascinantes, magnetizantes, o movimento ou a placidez das águas, a poesia da luz do sol ou da lua, a instigância dos reflexos e dos sombreados.

Aprendi com meu saudoso pai, Eduardo Lancellotti, um mago amador da aquarela, a apreciá-la através da alma, do espírito, da pele, do coração – jamais, somente, através da razão ou da educação, daquilo que se chama, convencionalmente, de Cultura. Eu ainda me lembro, meio século atrás, e eu me lembro arrepiado, de como o meu pai umedecia o papel e, então, pausadamente, pacientemente, quase apaixonadamente, deixava que as cores escorressem, aqui e ali se chocassem, em certos pontos se combinassem, num processo delicadíssimo de criação de novos matizes, de doces tonalidades.

Ao examinar a Veneza de Cláudia, a cada jornada, me sobem à mente aqueles tempos de aprendizado que eu jamais completei.

Melhor, mais me inebria a constatação de que, nestes idos de falaciosa modernidade, de arte supostamente provocativa e, muitas vezes, sem o menor sentido, sem a menor intenção de uma real transformação, ainda existe gente, como ela, empenhada no lirismo, na poesia, e não na busca do efeito apenas pelo rumor do efeito.

Obrigado, Cláudia, pela sua Veneza aqui em meu quarto. E por você permitir que, neste texto, eu possa defender a aquarela.

Exige muita coragem, muita competência, fazer aquarela.

Vem de um outro mundo quem consegue fazer aquarela.

Sílvio Lancellotti
Jornalista, Escritor e Food Stylist

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Vernissage dia 3 de dezembro de 2003 as 19:00 horas
Rua Pratapolis 186
Butantã
tel. (11) 37269720
Exposição até dia 9 de dezembro, das 9:00 as 19:00