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Tania Nitrini


Sobre minha pintura
Tania Nitrini
Setembro 2004

Escrever sobre minha pintura é muito angustiante. Ela não é racional. Qualquer texto me parece artificial e distante. Mas aceito o desafio.

Pintar é uma necessidade, um desejo de muitos anos. Não entendo porque só me permiti realiza-lo após tanto tempo! O que sei é que após iniciar-me na pintura, com orientação profissional, foi um caminho sem volta. Tenho uma compulsão: a pintura. O que quero fazer com ela? É o que tento descobrir diante da melhor angústia de minha vida.

Acho que a minha pintura é barroca como eu também sou barroca, como o Brasil é barroco. Se aceitarmos que a pintura é barroca ou clássica, já sou barroca por exclusão. Não sou clássica. Meu barroquismo é envolto em mantilha medieval. Vejo-me desconfiada, de cabeça encoberta em mantilha de renda preta, entrando na Igreja, como na minha adolescência. Até encantar-me com explicações da ciência sobre a origem da vida e abandonar a religião.

Em minha pintura há fortes elementos do expressionismo. É instintiva e expressa meus sentimentos. Sempre tive grande curiosidade pelo que se esconde nas cabeças e uma grande atração pelo que extravasa da cabeça quando não há nenhum espaço em seu interior. Queria fazer Psiquiatria quando cursava a Faculdade de Medicina.

E mais, minha pintura é Arte informal, imaginativa, gestual e espontânea. Quando finalmente decidi fazer Artes Plásticas era um momento de crise com a Saúde Pública. Eu era apaixonada por Saúde Pública. Quando decidi parar com Medicina estava apaixonada pela pintura. Gosto de pintar simplesmente entregando-me ao ato de pintar. Sem regras ou qualquer tipo de bloqueio.

Quando começo a pintar uma tela quero a intimidade. Não sei o que será a pintura, mas em cada tela tenho uma viagem. Até identifico as “paradas”, como numa viagem de trem...Quando eu ia de Alexandria para Mossoró, no trem que já não existe mais, eu sabia que o ponto de chegada era lá, mas nunca sabia o que aconteceria... porque era um ponto de chegada transitório. Acho que em minha pintura o ponto de chegada será sempre transitório. Sempre quero mais até não poder mais. É que a vida é bem maior do que eu – e eu queria ser do tamanho da vida. E é nessa diferença que está o meu desejo.

O lirismo e a provocação estão em minha poética, fruto da experiência de vida na caatinga do sertão nordestino, meu ninho, e na grande metrópole, onde vivo desde os 24 anos.

Caatinga e metrópole se confundem no jogo de linhas e sombras, de cores fortes, onde às vezes abuso do amarelo e outras do cinza, e sempre dos vermelhos e preto. Galhos secos, entrecruzados, ou traçados urbanos complexos e confusos são imagens recorrentes que se fundem. Essas paisagens me tragam e me envolvem, e fico pequena em seu emaranhado, que assusta e também promete encanto, magia e aventura. Tudo isso e ainda um labirinto de encontros e desencontros da mente humana? Embora em minhas pinturas não haja figuras humanas, elas estão presentes, de uma maneira bem pessoal.

A composição cromática de minhas pinturas é influenciada pela minha origem nordestina. Diz-se que a arte nordestina é multicolorida para se contrapor à paisagem árida e quase monocromática. São imagens coloridas das bonecas de pano, dos tapetes e colchas de retalhos de tecidos, do artesanato de barro e dos bordados feitos à mão ou mecânicamente, bandeirinhas de festas juninas e vestuário de danças populares e folclóricas. O solo tropical, de sol ardente, me leva à utilização excessiva de rosa, púrpura, laranja, amarelos e vermelhos. Eles representam, em minha pintura, o lirismo da aurora e do crepúsculo, e o temível sol de meio dia.

Da grande metrópole influenciam minha pintura "o mar de cabeças" de uma rua do centro da cidade em qualquer hora de um dia normal de semana, os lares improvisados embaixo de viadutos, os corpos dormentes envoltos em cobertores e papelão, aos montes, nas calçadas, a negligência com a exploração de menores nos faróis, a beleza da mistura racial, o encanto das edificações de diferentes épocas e estilos, a ousadia dos arranha-céus, os longos congestionamentos de trânsito, as luzes coloridas que piscam de placas luminosas e outdoors, convidando as pessoas para embarcarem em sonhos, e a multiplicidade de opções de sonhos...

No sertão nordestino ou na grande metrópole, tudo existe em excesso. Há excesso de vida e excessos na falta de viver. Esse excesso transborda em minha pintura, também envolta em pesquisa. Nos estudos de minha origem, tento compensar minha ausência do ninho, e busco inspiração nas mulheres indígenas e africanas escravas, de nomes ignorados, ausentes de nossa História oficial. Tenho necessidade de me apropriar de um conhecimento de minha história, da história de minha família e do lugar em que nasci, tentando reconstruir uma identidade que incorpore elementos submersos em uma colonização baseada na supremacia do colonizador. É o meu lado racional a serviço do imaginário. Essa busca é o que move minha pesquisa na pintura e incorpora uma obsessão no meu trabalho, que se manifesta na minha poética de cores.




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