Picasso em Málaga


Plaza de La Merced

1944 foi um ano marcante para Picasso. Dia seis de junho os americanos desembarcaram na Normandia. Dia 25 de agosto americanos, ingleses e franceses libertaram Paris.

Quarenta e dois dias depois, em 5 de outubro, Picasso filiou-se ao Partido Comunista Francês.

Ser anti Franco, antifascista, antinazista não lhe bastava. Era preciso assumir publicamente uma posição política clara.

Durante a ocupação a Resistência encontrou no Partido Comunista Francês, aliado sem igual. Picasso não ficou indiferente à colaboração que se estabeleceu.

Contatos com importantes membros do Partido, como André Malraux, Louis Aragon indicavam-lhe que não podia permanecer à margem do processo de reconstrução. Filiou-se.


Museu Picasso, Málaga

Foi duramente criticado. Pela direita e pela esquerda. Mas, não retrocedeu.

As portas que fechara na Espanha com seu anti franquismo a partir da filiação bloquearam-se de vez.

Isso ficou visível quando dez anos depois viu Málaga, sua cidade natal, recusar “dos camiones”, ” dois caminhões”, cheios de suas obras.

Paulo, seu filho com a bailarina russa Olga Koklova, encarregado de tratar da instalação de um museu Picasso, disse-lhe que Málaga e a Andaluzia não estavam interessadas em Pablo Picasso.

Não era a primeira vez que sua cidade natal virava-lhe as costas. Foi assim em dezembro de 1900 quando voltou de Paris e o melhor hotel de Málaga negou-lhe estada por estar cabeludo e sem terno e gravata.

Picasso vivera em Málaga desde que nasceu em 1881 até 1891 quando foi para La Coruña. Em 1895 foi para Barcelona.


Femmes, Picasso

Depois da passagem por Málaga em 1900, da história do hotel e de ouvir recriminações de seu tio Salvador, Picasso nunca mais voltou à cidade.

Cento e três anos passados Málaga e a Andaluzia receberam Picasso em outubro com toda pompa e circunstância.

Ironicamente, dia 27 também se esperava o rei que Franco educou para governar a Espanha para inaugurar o Museo Picasso.

Na Plaza de La Merced,praça em que Picasso nasceu, jovens gritavam: “ El rey! El Rey!”.

Dali teria um orgasmo pensando que se referiam a ele.
E Picasso?

Bolaria uma história das muitas que inventava envolvendo Dom Henrique Salgado e Dom Hilário Cuernajón Nuñes de Vaca recém chegado de Navas de Malvivir... Morreria de rir.

Doações e empréstimos feitos por Christine Ruiz Picasso, a segunda mulher de Paulo e pelo filho dos dois, Bernard constituem o acervo à mostra: 331 obras. Dessas, 155 fazem parte da coleção permanente, exposta em 12 salas. Outras 87 integram à mostra “Le Picasso des Picasso”, “O Picasso dos Picasso”. 89 em comodato por dez anos completam o acervo picassiano à mostra.

Muitas obras estão em exposição pela primeira vez. O ineditismo revela um Picasso sempre surpreendente.

O Museo Picasso de Málaga, instalado no Palácio Buenavista, construído no século XVI, comprado e restaurado por 66 milhões de euros pelo governo da Andaluzia desde sua abertura passa a ser a nova atração para os 15 milhões de turistas que anualmente visitam a Costa do Sol espanhola.

Esperemos que Málaga recupere o tempo que perdeu. Arrependo-se da burrice.


Picasso, Mediterrâneo

Carlos von Schmidt
São Paulo, 10 de janeiro de 2004 21h21’