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Cabeceando com Granato
No MOMA de New York Andreas Gursky. No Jeu de Paume de Paris, Picasso Érotique. No MuBE
de São Paulo, Heads de Ivald Granato. Não há nada mais gratificante para mim, que passo boa parte de
minha vida em bienais, aqui e no exterior, em museus e galerias, lá e cá, do que ver uma exposição como Heads.
Melhor, só o convés de um veleiro, boa companhia, muito sol, céu e mar.
Ao ver Heads me dei conta de que estou saturado de exposições que não passam de enganação, de
instalações vazias, de obras "conceituais" sem conceito nenhum. De performances revoltantes. Dinossauros com
pretensões à borboletas. Verdadeiros ultrajes à inteligência.
A permissividade da arte transformou-a num bordel. Em casa de mãe Joana. Sem dono, onde ninguém manda,
todos gritam e ninguém se entende. Nessa briga de foice no escuro, vale tudo. Tem de tudo. Tudo mesmo. Putaria,
mau caratismo, servilismo, chaleiragem, puxa-saquismo, venalidade total.
Por isso quando Granato apresenta Cabeças é para se gritar: Aleluia! Aleluia! Durante três anos
esteve fora do circuito artístico. Nesses 36 meses, pensou, gestou e pariu Cabeças. Vendo a mostra
senti imenso orgulho de ter feito sua primeira grande exposição, no MAB, Museu de Arte Brasileira, da FAAP,
em 1975.
Eu estava certo. Granato não era um porra-louca. Não!!! Cabeças mostra também que o artista não
era um arrivista, um oportunista correndo como um desesperado atrás do sucesso. Talvez não tivesse a visão
que hoje tem de arte e do mundo, mas já era um iluminado. Hoje sua obra é reflexo direto dessa luz.
Não vou ficar aqui fazendo a apologia de Granato. Não é do meu feitio. Quero apenas chamar a atenção
para a mostra, das melhores individuais, senão a melhor, apresentada até agora. Sobretudo chamo a atenção
para a releitura que Granato faz de obras de alguns mestres.
Como Leger, Matisse, Picasso, Picabia, Jasper Johns, George Segal e Lichtenstein. Este
conjunto de obras ao meu ver é básico, fundamental. No contexto geral da mostra, é o ponto alto. O grande
orgasmo. O supremo gozo.
Há sutilezas que somente os que conhecem os originais ou boas reproduções, poderão captar. Na
releitura de Lichtenstein esse toque chega as raias da genialidade. No balão de história em quadrinhos
a substituição da palavra studio por head, revela um Granato que não se limita à
gestualidade, à prática de pintar. É refinadíssimo na arte de pensar. Se assim não fosse dificilmente
teria chegado ao quebra-cabeças no chão, realizando com cabeças de madeira cortadas.
O Granato barulhento, exibicionista, escandaloso, em Cabeças, não grita. Nem berra.
Murmura... Susurra...
publicado no jornal VILLABOIM NEWS em maio 2001.
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